Qual a origem histórica da Ikenaba?
Descobri o prazer
de viver entre os homens, ao colocar
no tokonoma uma camélia do meu quintal.
Meishu Sama
A arte de se fazer ikebana é uma prática muito significativa dentro da doutrina de Meishu Sama. Ele mesmo fazia questão de colher galhos e flores e fazer, pessoalmente, os arranjos de todos os cômodos de sua casa.
A missão das flores vai muito além do que nosso olhos podem ver, há também uma função espiritual . Segundo Meishu Sama, espíritos malignos não gostam de flores, pois um ambiente com limpeza, ordem e beleza não lhes agrada. Por esse motivo, a iniciativa de colocá-las em todos os locais traz enormes benefícios!
Hoje, no mundo, existem diversas escolas artísticas de ikebana, das mais tradicionais às mais modernas. Mas todas elas tiveram uma origem comum, na antiguidade, com o costume das pessoas coletarem elementos que consideravam belos na naturezae oferecerem às divindades. Como, então, essa prática se transformou e tornou-se algo tão significativo na cultura japonesa, sendo nomeada de “ikebana”?
Da China ao Japão
Na Índia, as flores sempre tiveram um papel cultural importante. Com o surgimento do budismos, doutrina fundada pelo príncipe indu Siddhartha Gautama após alcançar a iluminação, elas passaram a fazer parte dos ritos e de ensinamentos dessa doutrina, desde sua origem.
Embora não se saiba exatamente como ocorreu, historicamente a introdução do budismo na China foi feita durante a dinastia Han (206 a.C – 220 d.C). Segundo uma antiga história, o imperador Ming de Han (28 d.C. – 75 d.C.), certo dia, teve uma visão no céu de um ser dourado. Ao relatar tal acontecimentos a seus conselheiros, estes acreditaram tratar-se de uma visão da figura de Buda. O imperador, então, enviou cerca de 400 emissários a outros países a fim de obter informações sobre a doutrina de Buda.
Escrituras budistas teriam sido trazidas à China nas costas de cavalos brancos por Dharmarakṣa e Kaśyapa Mātaṅga, dois grandes monges indianos. Assim, deu-se início à expansão, na China, de todos os aspectos presentes na doutrina budista.
No ano de 607, Ono no Imoko, diplomata japonês nomeado pela Imperatriz Suiko, foi enviado pela primeira vez à China, para se apresentar ao imperador chinês entregando uma carta de saudação do príncipe Shotoku. Imoko adquiriu muitos conhecimentos culturais, foi apresentado aos ensinamentos budistas e passou a aprimorar-se em nas práticas da doutrina, as quais incluíam as oferendas florais
Ao retornar ao Japão, Ono no Imoko optou pela vida monástica e adotou o nome de Senmu Ikebono. Assim, passou a praticar tudo que aprendeu em solo chinês relacionado à doutrina de Buda, como a entoação de mantras, a queima de incensos em homenagem às divindades e aos ancestrais, bem como a prática de arranjos florais nos altares.
Desenvolvimento da arte da Ikebana
Com a expansão do budismo pelo Japão tornou-se cada vez mais popular o costume de arranjar flores com o cuidado no posicionamento estético dos elementos.
Durante sucessivas gerações de monges que habitaram o Templo Rokkakudo – um dos templos construídos pelo príncipe Shotoku – a arte dos arranjos florais foi praticada e aprimorada o que tornou o local, situado em Kyoto, o berço do que conhecemos hoje como Ikenaba.
No Japão, existe o costume de discípulos adotarem parte do nome de seus mestres. Assim, nos anos seguintes do trabalho de expansão doutrinária de Senmu Ikebono, diversos monges adotaram o nome “Ikebono”, horando e mantendo o legado do grande monge precursor.
Em registros históricos do século XV, o nome do monge Senkei Ikenobo – seguidor da tradição fundada por de Senmu Ikebono – é mencionado como “mestre dos arranjos florais”, considerado como um dos arranjadores de flores mais populares da época. Sacerdote do Templo Rokkakudo, em 1462 Senkei Ikenobo foi convidado por um guerreiro para arranjar flores em uma ocasião festiva e seus arranjos foram muito apreciados pelo povo de Kyoto. Os primeiros manuscritos de ensino didático do ikebana datam desse período, mas as primeiras referências que mencionam “hastes de flores delicadamente arranjadas em vasos” aparecem na obra “Man’yoshu” (“Coleção das Dez Mil Folhas”) o mais antigo compilado da poesia japonesa, feito em torno de 759 d.C., durante o período Nara.
A maneira de arrumar as flores feita por Senkei Ikenobo ia além dos estilos tradicionais das oferendas budistas, e isso foi de grande impacto para que, na época, surgisse uma maneira exclusiva de se fazer os arranjos florais dando início à ikebana como parte da identidade cultural japonesa. Desse modo, o termo Ikenobo estabeleceu-se tanto como um termo ligado à origem da ikebana como para designar a mais tradicional escola de arte da ikebana.
Ikebana Sangetsu (lê-se Sangetsu)
Ao longo do tempo, a arte da ikebana foi de ramificando e diversos escolas foram surgindo, cada uma com seus fundamentos e estilos. As escolas Ikenobo (1462) e Ohara-ryū (1895) as mais são escolas tradicionais, enquanto Sogetsu (1927) destaca-se como escola contemporânea.
A mais próxima do estilo desenvolvido por Meishu Sama, a escola Sangetsu, foi fundada oficialmente, em 15 de junho 1972, por sua filha, Itsuki Okada (Sandai Sama).
Nela são ensinados os princípios pregados por Meishu Sama que buscam a criação de lindos arranjos, mas com mínima interferência na beleza natural das plantas. O ideal é que, desde o cultivo, elas estejam isentas de qualquer tipo aditivo. Ao serem colhidas, flores e galhos devem ser tratados com todo o cuidado e, no processo de montagem dos arranjos, é fundamental respeito à constituição natural de cada elemento para, assim, se preservar também, além da forma, energia vital que ele carrega.
Kado Daishizen
Aqui no Templo Luz do Oriente, praticamos o estilo Kado Dai Shizen, que foi fundado pelo Reverendo Minoru Nakahashi. É, de fato, um estilo ainda pouco difundido e praticado, até o momento, por pessoas ligadas ao nosso Templo. Mas esperamos que se espalhe cada vez mais!
O estilo busca seguir as orientações de Meishu Sama sobre como lidar com as plantas. As fotos deste artigo são todas em estilo Kado Dai Shizen.